Sunday, October 30, 2005

 

Wandering boy scout with a skateboard

Estamos de volta. Sem motivo. Só porque apetece. Quem é que disse que agarrado à ideia de voltar tem que estar um motivo? Quem me condicionou a pensar isso?
Porque raio havia eu de dize-lo mesmo que ouvesse um motivo? Dá quase a impressão que a opinião de mais alguém interessa um bocadinho que seja, e uma justificação justifica-se. Não acontece.

Eu sou o que? Paranóico? Ouço vozes? Agressivo? Tas parvo ou quê? Queres que te parta a tromba toda, é? Ta mas é calado, pá.

Consigo ver velhotes a discutirem, pela janela. Sei que discutem futebol, porque é o que fazem todos os dias. Não os oiço. Mas sei o que cada um diz. O corpo deles fala. Percebo que o que está de braços estendidos, palmas das mãos á mostra, tenta convencer outro de qualquer coisa. Ou talvez defenda alguma coisa que foi previamente atacada. Sei que o que está de braços cruzados olhando o outro ligeiramente de lado, nunca será convencido.

E as pessoas que partem para os debates, da mesma maneira que vão sair? Elas são o quê? Elas fazem o quê? Como se chamam elas?

Chamam-se nós todos. Pois é. Nós somos todos broncos que nem tijolos de 12 buracos.
O leitor é dotado de um sentido crítico tão afiado, de uma perspicácia tão audaz, de uma inteligência tão brilhante que é impossível admitir, sequer ponderar por um segundo que outra pessoa possa um grama de razão. Antes comer merda podre.
Todas as discussões são pessoais. Porquê? Porquê é que é tão importante para o leitor ter razão? Claro que só falamos de âreas cinzentas, o politicamente correcto fica fora desta bosta toda. Se o leitor aparecer aí a defender o uso de drogas misturadas com alcool e barbitúricos, com o objectivo de abusar sexualmente de menores, de incendiar hospitais, e limpar etnicamente zonas do país, não vai ter razão. O que é estranho, é que não é pela contraposição de argumentos (embora eles existam em barda), é porque todas as pessoas, leitor incluído, sabem que todas as outras pessoas reprovam isso. Conclusão: É fácil defender o politicamente correcto. Toda a gente já viu gajos em campanha a dizer que são contra o desemprego, ou contra a estagnação da economia, ou contra o pai natal usar cinta para esconder a barriga. E toda a gente sabe que isso é ruído. Isso quer dizer :'' Sou politicamente correcto. Sou normal. Sou como a maioria de vocês. Votem em mim, que eu dou o cú e 10 tostões se for preciso''.

Ninguém ouviu falar de um gajo chegar, ter ideias próprias e tentar convencer os outros dessas ideias, ao mesmo tempo que aprende com eles, e dialecticamente altera as próprias ideias, aceitando que os outros possam ter razão nalguns pontos. Ninguém ouviu um gajo dizer, ''epa pois é, aí tens razão...''. Nenhum político diz isto a outro, nenhum patrão diz isto a um empregado (e vice-versa), nenhum governo diz isto a um sindicato (e vice versa). Nenhum velhote diz isto a outro. É como se fosse tabu. Antes cortar os tomates com um cutelo, e meter pimenta no cú.

E se alguém defender alguma coisa com base em emoções, então é o descalabro. Todos os argumentos servem. Todo aponta na mesma direcção. A razão é escravizada, e produz razões e contrarazões a ritmo industrial.

Mas temos conversa. Malta a dizer que se vai promover o diálogo. A dizer que se vai procurar convergências. Convergir pontos de vista irredutíveis... Faz-se quando as paralelas se encontrarem.

O Calvin (esse filósofo) diz que os debates são concursos. O objectivo é roubar a palavra e correr no sentido do nosso ponto de vista. É indiscutivelmente verdade.

Porra.

Alguém dizia que um tertúlia em toda a gente esta de acordo é uma tertúlia perdida. Eu acho que uma tertúlia onde toda a gente parte para a discussão numa posição dá qual não vai sair nem que chovam vacas amarelas, é inútil, e irritante, é tortura.
Os debates arrastam-se, os argumentos são bolas de papel, arremessadas contra paredes de betão. Os debates são barulho. Em vez de gerarem mudançam, geram irritação, dores de cabeça e úlceras pépticas.

Até amanhã, e se alguém quiser discutir alguma coisa, não vale a pena porque eu tenho razão.

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